Depois de um longo tempo aqui estou eu.
Não deixei de escrever por falta de assunto, mas porque estava afogada. Retorno à superfície para "boquejar" um pouco sobre a mulher que aspiramos ser na reflexão do machismo projetado sobre nós mesmas e como isso se dá na vida privada, na vida a dois.
Parece até título de artigo antropológico, e podia ser, mas não é. Sou apenas eu aqui caraminholando.
Vamos lá, passei os últimos tempos entre Brasília, Rio de Janeiro e Barra Mansa. Porque moro no Rio, meu filho mora em Barra Mansa e fui trabalhar em Brasília. E o que isso pode ter de mais? Nada ué! Se não fosse o fato de eu ser mulher. Porque quando digo que moro no Rio, leia-se:é onde tenho casa e marido, quando digo tenho filho em Barra Mansa, é onde tenho que amar incondicionalmente, ser maravilhosa, disposta,atenta e educar; quando digo em Brasília é onde tenho que ser competente, profissional, bem sucedida, respeitada técnica e intelectualmente e reconhecida.
Todas essas tarefas juntas são humanamente impossíveis. Não; não podemos fazer isso tudo bem feito, por isso dolorosamente tive que fazer as escolhas. E não sei o quanto essa decisão pode ser comum, também não sei fazer juízo de valor dela, apenas diante da recessão do tempo e da capacidade humana da minha pessoa de administrar tudo, fiz os cortes na dedicação à casa e ao marido, abandonei tudo. Meu companheiro a meses pede comida em um restaurante mais ou menos do bairro, cuida do gato sozinho, faz as compras, paga as contas,não tem ninguém para conversar; porque sim, eu tenho chegado entre um compromisso e outro, com fome, dor de cabeça, irritada, e cansada, muito cansada...
Fiz a escolha pelo trabalho e filho, e isso poderia ser simples e racional, sem dilemas e sofrimentos, mas sou fêmea, num mundo em que até os cheiros predominantes são os de machos e os que os machos gostam de sentir. Isso significa que independente do que eu escolhesse, haveria culpa. Deixar o marido e a casa de lado, não significa que no meu íntimo não quisesse também trazer flores para sala e de vez em quando cozinhar um peixinho que meu marido adora, acompanhado por uma Gold, regados à boas risadas, fofoquinhas brancas, conversas e planinhos. A antropóloga diz: " se ocupe menos dos outros e das obrigações socialmente constituídas para você mulher, e descubra o que te faz feliz." Caraca, mas o que me faz feliz é também esse casamento não convencional que tenho, mas cheio de afeto, companheirismo, compreensão e dancinhas no corredor (não considero todas as coisas chatas quando tenho culpa rsrs), e deixá-lo de lado... Muita culpa, muita culpa.
Talvez como uma forma de auto-punição inconsciente eu tenha me privado de algumas coisas que gosto, como exemplo, o Blog. O que deve ter piorado o cenário, e aumentado a irritação.
A um tempo eu venho falando isso, essa mulher que nós desejamos por tantas lutas e por tantos séculos, não abriu mão de nada, chegou no seculo XXI, com mais uma função na qual ela tem que ser impecável, continua dona da casa, mãe, e agora profissional. Uma maluca, estérica, quase uma esquizofrênica. Ops! parece que estamos então discutindo a mesma mulher lá do século XIX? Não ela mudou, sofre mais, porque não ignora sua condição e tem que dar conta de conjunto muito maior de competências.
É isso, essa mulher compromete a vida privada do casal porque não relaxa. Não aprendeu a abrir mão, é uma gulosa.
E esse drama não é exclusivo, a amiga que abriu mão da casa, não recebe mais as pessoas, a que abriu do filho, faz novenas para que ele não a odeie e não se torne marginal. Que loucura!!!
Penso que esses filhos tem pais, que nestas casas tem um marido/companheiro, e que este marido/companheiro tem que ser um homem também do seculo XXI.
A encucação é nossa, não sei de verdade se nossos maridos são tão exigentes assim. Já pensei que nesse século, talvez as avós sejam mais machistas que nossos maridos e namorados. Não sei, a culpa vem quando lembro da casa da minha mãe e da minha avó. O marido tá tranquilo na poeira, e disse que vai resolver contratando uma diarista, outro dia me perguntou sobre o que eu achava de um aspirador de pó. Trocou a ração do gato para evitar queda de pelos.
Claro que não nego a sociedade machista em que vivemos, e claro que em alguma medida ela ressona na nossa privacidade, mas creio que no interior da vida privada, muitas coisas já foram resolvidas, e a piração é nossa que não relaxamos, e ficamos, para além de tudo, copiando habilidades domésticas de nossas avós.
É isso, estou voltanto, respirando, e o vuco-vuco dos últimos meses foram de muito choro, cansaso, frustração, medo de não dar conta, e outras coisas do gênero. Parei, refleti e escrevi, acho que é hora de relaxar.
Oi Mirani, adorei a foto e o desabafo. Ser mulher como a gente se exige ser é uma jornada de 48 horas, uma jornada quase impossível, como você mesma bem define. Benvinda de volta ao Rio, boa decisão a de ficar só entre dois lugares - Rio e Barra Mansa - já é o suficiente! Boa sorte na vida a dois, que está sempre entre a delícia de ser mulher e o desafio de ser mãe e profissional. De toda forma, estou por aqui, madrinha dos dois e por tabela do Miguel. Conte comigo, sempre. Você é uma batalhadora, digna de admiração, mas tudo isto tem um preço. A felicidade é só uma decorrência natural. Beijos, Vera
ResponderExcluirValeu Vera, obrigada.
ExcluirEnquanto eu lia, pensei: "ah, eu sabia, eu já tinha dito que ela tava trabalhando demais, que ia acabar ficando doente, que loucura trabalhar dessa maneira!". Mas na hora de escrever o que acabei escrevendo, pensei, "mas não estamos todos assim?" Quando foi que ficamos tão trabalhadores? Mudei há meses, e toda segunda-feira eu quero convidar os amigos para conhecer minha casa nova no final de semana, mas de repente, quando eu olho, já é domingo, e não chamei ninguém porque não parei de trabalhar, e faço aquela velha anotação mental, "dessa semana, não passa". Tô chato para caralho, mais reclamão do que o normal, tenho perebas pelo corpo inteiro e uma dor de cabeça diária. Eu até durmo vendo televisão, veja só. Que terror parecer com nossos pais! Mas acho que é um caminho sem volta, e não deixa de haver um prazer estranho e intrometido nessa danação. De toda forma, faz um friozinho no Grajaú, vamos tentar tomar um vinho no fim de semana? Kkkkkkkkkkkk
ResponderExcluirQuando foi lucas? e o pior fazemos isso com um imenso prazer. Na verdade trabalho quando não tenho obrigatoriamente que trabalhar, porque aí quero aperfeiçoar. Será que padecemos de algum mal social ocidental contemporâneo?rsrsrsrs.
ExcluirConforme tenho dito acredito que vimos a este mundo para comer e fazer sexo, todo o resto é invenção do capital, então trabalhar demais seria consequência dessa lógica capitalista e óbvio, algo em correspondência com seus desejos e ambições pessoais. Mas no caso em questão esse argumento é falacioso, porque o dinheiro ganho não é diretamente proporcional a quantidade de trabalho executado. Mas nós temos uma vaidade, maior que nós talvez, e que conseguimos esconder a maior parte do tempo. Mas o fato é agente ama o que faz, "e acredita estar contribuindo com sua parte para o nosso belo quadro social". eu me apaixonei pelo meu trabalho, me deixei seduzir, cedi a seus caprichos, e atualmente sou dominada numa relação masoquista, onde eu permito que ele acabe comigo, e no fundo eu gosto.
hahaha adorei Mira! principalmente a foto! concordo com o Lucas, eu tb to mt chata. agora com esse barrigão aki então affff, querendo trabalhar, fazer pos e ainda curtir a casa e os amigos... mas a gente consegue, mesmo sendo gulosas!
ResponderExcluirah, aki é Julia Ramalho, não apareceu meu perfil ;)
Excluirpois é amiga precisamos desacelerar........
Excluir"Claro que não nego a sociedade machista em que vivemos, e claro que em alguma medida ela ressona na nossa privacidade, mas creio que no interior da vida privada, muitas coisas já foram resolvidas, e a piração é nossa que não relaxamos, e ficamos, para além de tudo, copiando habilidades domésticas de nossas avós."
ResponderExcluirÉ isso ai Mirani! Vamos aprendendo a distribuir essa sobrecarga de tarefas e responsabilidades. Trabalho cada um tem o seu, mas arrumar e cuidar da casa, fazer/comprar/providenciar a comida e dar atenção ao filho é tarefa que não tem gênero. Por aqui meu filho já me ajuda a guardar a roupa limpa, separar a roupa suja e perguntou outro dia qdo vai aprender a lavar roupa! Mas os próprios brinquedos tem que ficar em cima...hehe....Mas bem...o importante é que ele enquanto menino se vê ativo e participante das tarefas de casa.
Já o repreendi umas três vezes depois de comentários do tipo "fez que nem mulherzinha"....q mulherzinha? q história é essa? e ai a gente vai desconstruindo essencializações de gênero e verdades impostas...o caminho é longo mas certamente muito prazeroso! é nós! :D ( Larissa)
É nós mesmo!rsrsrs
Excluirque podemos essas reflexões e essas ações, possíveis por toda modificação já provocada em nós, nos homens e no espaço.
"o caminho é longo mas certamente muito prazeroso! é nós! :D ( Larissa)".
o caminho é longo sim, não fomos nós que o começamos, mas estamos fazendo a nossa parte.
bjos